COMPORTAMENTO

A reinvenção do varejo on-line

Varejistas estão tendo que aprender como encantar estes consumidores de maneira mais dinâmica e envolvente
Por Cristina Sant'Anna / Colunista da Lançamentos - 18-11-2020

Novas experiências de compras estão buscando um consumidor cada vez mais on-line. De peças vintage a marcas de estilistas, os clientes estão tentando se acostumar à nova realidade longe das emoções nas lojas físicas.

A terapia de compras, tão usada antes da pandemia, não é mais a mesma. O impacto do coronavírus levou a uma nova cultura de trabalhar em casa; a um aumento nas vendas de calçados e roupas confortáveis e casuais; lojas fechadas e um ambiente mais estéril nos pontos de venda que reabriram. Inúmeros consumidores apertaram os cintos e estão comprando com maior consideração e prioridades revisadas.

E assim os varejistas estão tendo que aprender como encantar estes consumidores de maneira mais dinâmica e envolvente. Isto tem acontecido através de lives no Instagram e Facebook, em que a alegria de descobrir um novo look bacana mostrou-se não tão fora de alcance como se imaginava. Os varejistas e fornecedores têm compensado a falta de interação tátil com lançamentos surpresa e formatos interativos e divertidos projetados para a tela.

A ideia é sempre sair do formato tradicional de loja de departamentos ou boutique para modelos que são mais personalizados, ou mais alinhados com as comunidades on-line e estilos de vida. No Instagram, métodos de apresentação com modelos têm atraído muita audiência.
Mas vamos falar um pouco de experiências internacionais que tiveram bons resultados?

A LuisaViaRoma, varejo de luxo italiano instalado em Florença disse que há muito espaço para crescer com as vendas em streaming ao vivo e também começa a usar a realidade aumentada. A empresa está revolucionando a experiência de compra, alavancando a criatividade e a inovação. Em maio, lançou um app-game chamado Mod4, testado em países do Leste Europeu, com resultados animadores. Em breve, vai ativá-lo também na Alemanha, França e Espanha, enquanto na Itália planeja lançar até o final do ano, quando já estiver aprovado nos outros países.


O aplicativo permite ao usuário criar seus próprios avatares, colecionar roupas, interagir e competir entre si, participar de desfiles, showrooms virtuais, votar nos melhores estilistas e ganhar pontos do programa de fidelidade, que podem ser gastos na compra de roupas reais no site LuisaViaRoma. Um formato estudado antes do início da pandemia, mas que parece ter sido feito especialmente para o novo contexto comercial, como também demonstram os primeiros feedbacks.

O índice de conversão do app é três vezes maior que o on-line e também o tempo de permanência é maior: 15 minutos no Mod4, enquanto no e-commerce é, em média, 3 a 4 minutos. Números que contribuem para impulsionar as vendas on-line, fazendo de 2020 um ano muito positivo para a LuisViaRoma: 180 milhões de euros no volume de negócios estimado, após um crescimento de 34% nos primeiros oito meses do ano nos negócios digitais.


Em breve, clientes poderão criar suas roupas remotamente usando ferramentas como a realidade aumentada. Começarão com os calçados, através de um projeto desenvolvido com uma empresa russa, muito ambicioso e com tendência para crescer, também porque os primeiros casos de venda com realidade aumentada estão registrando taxas de conversão muito interessantes.

E a multimarca Florentina, que vende on-line desde 1999, tem toda a intenção de fazer o melhor uso das tecnologias para aumentar o faturamento e a fidelização. Um serviço de compras pessoais aos usuários do site já é oferecido. Durante a navegação aparece um pop-up indicando a possibilidade de receber a orientação de um dos vendedores da loja física via WhatsApp ou videochamada. Quem quiser pode se conectar ao vivo, caso contrário também será possível agendar um horário. Em breve estarão ativas as sessões de compras ao vivo com um personal stylist. É uma tendência crescente, que já está fortíssima nos Estados Unidos.

De acordo uma pesquisa da Mintel nos Estados Unidos (de julho de 2020), aproximadamente um terço dos consumidores pressionou o pause na compra de roupas, enquanto 32% estão preocupados em comprar roupas em uma loja física. Isso criou um boom nas compras on-line de roupas de segunda mão e oferece novas oportunidades para os varejistas recriarem a alegria da descoberta em um formato virtual.

O mercado de revenda on-line deve superar os tradicionais brechós e o varejo de segunda mão nos Estados Unidos, passando de US$ 30 milhões em 2020 para US$ 70 milhões em 2027, de acordo com dados da empresa de análise de varejo Future Market Insights. Aqui no Brasil o mercado de segunda mão ainda se restringe a artigos de luxo e é bem tímido, sem investimento de grupos maiores.

Internacionalmente a categoria foi adotada por grandes varejistas on-line: A Farfeth tem o programa de revenda que chamou de Second Life para bolsas de grife. Surgiram ainda o ThredUp e Depop. A ASOS se antecipou e tem um mercado vintage em sua plataforma de e-commerce desde 2010. Antes da pandemia, esses canais coexistiram com as boutiques vintages mais tradicionais e os mercados de pulgas - espaços que definem a experiência de compra pessoalmente e são sinônimos de caça ao tesouro. Agora, até mesmo esses varejistas estão se conectando à Internet.

Mas a mudança para o on-line não é uma tendência nascida exclusivamente da necessidade de alcançar os clientes presos em casa. Marcas de estilistas como Rodarte e Anna Sui lançaram recentemente lojas virtuais para atrair a base de clientes da Geração Z, mais ecologicamente corretos, com mercadorias de temporadas anteriores. As plataformas on-line também dão às marcas acesso a mais experiências sociais e comunitárias de compra direta ao consumidor - essencialmente oferecendo o equivalente digital de uma feira offline de segunda mão.


Em maio de 2020, a ex-COO da Stitch Fix, Julie Bornstein, lançou um mercado chamado The Yes, que aproveita a inteligência artificial para prever os gostos de moda do consumidor - tudo que os clientes precisam fazer é responder sim ou não a uma série de roupas na tela e eles serão apresentados em um feed personalizado de peças, de Everlane a Gucci.

Antes da pandemia, o e-commerce não chegava perto da emoção de certas experiências de compra offline, mas as marcas agora estão adotando futuros digitais mais inovadores. Espera-se que esses formatos estejam longe de ser temporários e que se desenvolvam também no Brasil.

Um caminho interessante para as marcas brasileiras pode ser o marketplace. As marcas estão cada vez mais se voltando para plataformas e este pode ser um caminho interessante para as brasileiras ainda sem presença forte digital, pois podem ter uma visibilidade e exposição que só as grandes multimarcas on-line costumavam oferecer. A única dúvida é: eles podem realmente entregar o mesmo nível de conhecimento da marca - e volume de vendas?